O Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou a obrigatoriedade de a Fazenda Pública apresentar os documentos e cálculos do valor devido para a instauração do cumprimento de sentença no âmbito dos juizados especiais. Tal determinação, embora inverta a regra geral estabelecida pelo Código de Processo Civil (CPC) – que atribui ao credor a responsabilidade pela apresentação dos valores para execução –, foi considerada legítima pelo Plenário, visando à otimização e celeridade dos trâmites processuais.
A decisão foi proferida no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1528097, ao qual foi atribuída repercussão geral (Tema 1396), estabelecendo-se, assim, um precedente vinculante para todas as causas similares em curso no Poder Judiciário.
A controvérsia em análise teve origem em questionamento do Estado de São Paulo, que impugnava decisão do Tribunal de Justiça local que lhe impunha a obrigação de indicar o montante devido no cumprimento de sentença. O TJ-SP fundamentou seu entendimento na jurisprudência do próprio STF, especificamente na Arguição de Descumprimento de Preceitos Fundamentais (ADPF) 219, que já havia validado a incumbência da União de elaborar os cálculos em execuções de sentenças nos juizados especiais federais.
No recurso apresentado ao STF, o Estado de São Paulo argumentou que essa interpretação não deveria ser estendida às fazendas públicas estaduais, alegando a insuficiência de estrutura e pessoal para a elaboração dos cálculos, bem como uma suposta ingerência indevida do Poder Judiciário na esfera do Poder Executivo.
O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo e relator do recurso, votou pelo reconhecimento da repercussão geral e pela manutenção do entendimento preexistente do Tribunal. Segundo o ministro, a partir da ADPF 219, consolidou-se a jurisprudência de que a denominada “execução invertida” é aplicável também aos juizados da Fazenda Pública.
Barroso salientou que a restrição de tal orientação apenas ao sistema dos juizados federais implicaria um tratamento discriminatório entre os entes federativos, o que é vedado pela Constituição. Adicionalmente, o ministro asseverou que a exigência da apresentação de documentos e cálculos para a satisfação da condenação reflete um dever de lealdade para com o cidadão, contribuindo significativamente para a celeridade processual. Ele também frisou que, mesmo quando o autor da ação apresenta os valores, a revisão dos cálculos para verificação de sua exatidão ainda compete aos entes públicos.
A respeito da alegação de afronta à separação de Poderes, o ministro Barroso pontuou que atribuir à Fazenda Pública o ônus de elaborar os cálculos constitui uma aplicação legítima dos princípios que norteiam o direito processual e os Juizados Especiais. Para o ministro, exigir que indivíduos de baixa renda apresentem cálculos atualizados para receber seus créditos comprometeria o princípio constitucional do acesso à Justiça.
A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte:
1. É possível exigir da Fazenda Pública a apresentação de documentos e cálculos para o início de cumprimento de sentença nos juizados especiais, nos termos da ADPF 219;
2. É fática a controvérsia sobre a hipossuficiência da parte credora para atribuição à Fazenda Pública do ônus de apresentação de documentos para início de execução de sentença em Juizados Especiais.