A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) deu um passo importante na garantia de direitos trabalhistas ao determinar o envio de ofícios à Uber e ao iFood. O objetivo é verificar se duas pessoas com dívidas trabalhistas possuem rendimentos por meio dessas plataformas. Se houver, a decisão já prevê a penhora de até 50% dos ganhos líquidos, com a ressalva de que o devedor deve ter acesso a, no mínimo, um salário mínimo. Essa medida atende ao pedido de uma trabalhadora que busca receber valores devidos.
Dívida Antiga e Busca por Solução
O caso em questão teve início em 2012, quando um restaurante em São José, Santa Catarina, foi condenado a pagar diversas parcelas a uma ex-empregada. Como a dívida não foi quitada e a microempresa não possuía bens para penhora, a execução foi direcionada aos proprietários. Em 2024, ainda sem receber o valor reconhecido pela Justiça, a trabalhadora solicitou que a Vara do Trabalho intimasse a Uber e o iFood para confirmar se os sócios estavam cadastrados nos aplicativos como motoristas ou entregadores, visando penhorar os valores que porventura recebessem.
Rejeição em Instâncias Anteriores e Nova Perspectiva do TST
Tanto a Vara do Trabalho de Florianópolis quanto o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12) negaram o pedido. A 1ª Vara entendeu que os valores recebidos por meio desses aplicativos teriam natureza alimentar e seriam impenhoráveis. O TRT, por sua vez, baseou sua decisão no artigo 833 do Código de Processo Civil (CPC), que protege salários e rendimentos de autônomos de penhoras, e argumentou que a exceção para pagamento de prestação alimentícia não se aplicava a créditos trabalhistas.
Contudo, ao analisar o recurso de revista da trabalhadora, o ministro relator Sergio Pinto Martins destacou que o CPC de 2015 ampliou a possibilidade de penhora de proventos e salários para incluir também os créditos trabalhistas, que possuem natureza alimentar. A jurisprudência do TST, então, evoluiu para admitir a penhora de parte dos rendimentos dos devedores, desde que respeitados os limites legais. Esse entendimento foi consolidado na tese jurídica vinculante do Tema Repetitivo 75 do TST, que permite a penhora de até 50% dos rendimentos líquidos, garantindo ao devedor um mínimo de um salário mínimo.
Com base nesse entendimento, a Oitava Turma determinou, por unanimidade, que, se forem identificados rendimentos dos devedores na Uber e no iFood, a penhora deve ser realizada imediatamente, respeitando os limites estabelecidos.
Processo: RR-0009480-24.2012.5.12.0001
Leia a íntegra do Acórdão:
RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA EXEQUENTE NA VIGÊNCIA DA LEI N° 13.467/2017 – EXECUÇÃO – PENHORA DE SALÁRIOS E PROVENTOS. § 1º DO ARTIGO 100 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA – TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. A impenhorabilidade de salários e proventos de aposentadoria passou por mudanças com a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015. O § 2º do artigo 833 da CLT passou a estabelecer exceção que prevê que os valores referentes ao disposto no inciso IV do mesmo artigo não serão aplicados quando se trata de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem. Nesses casos, a penhora deve obedecer às disposições contidas no § 8º do artigo 528 e no § 3º do artigo 529, ambos do CPC. Em consequência, o Tribunal Pleno desta Corte Superior, na Resolução 220 de 18 de setembro de 2017, alterou a redação da Orientação Jurisprudencial 153 da SbDI-2 para limitar a aplicação do verbete aos casos de determinação de bloqueios de numerários oriundos de conta salário ocorridos na vigência no CPC de 1973. Assim, com o advento do Código de Processo Civil de 2015, a exceção prevista no § 2º do artigo 833 possibilitou não apenas as penhoras realizadas para o pagamento de prestações alimentícias, mas também para os créditos trabalhistas, dada sua natureza alimentar. Julgados. Cumpre ressaltar que no julgamento do Tema 75 deste TST (leading case TST-RR – 0000271-98.2017.5.12.0019) o Pleno desta Corte Superior firmou tese jurídica no sentido de que “Na vigência do Código de Processo Civil de 2015, é válida a penhora dos rendimentos (CPC, art. 833, inciso IV) para satisfação de crédito trabalhista, desde que observado o limite máximo de 50% dos rendimentos líquidos e garantido o recebimento de, pelo menos, um salário mínimo legal pelo devedor.”, não remanescendo mais dúvidas sobre a penhorabilidade dos proventos. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.